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Produção em Massa
Produção em Massa

 

O Apóstolo da Produção em Massa

 

 

            Há muito tempo Henry Ford e o modelo T são símbolos da moderna era industrial. Até mesmo o posterior crescimento e o sucesso da General Motors, rival da Ford, deveu-se em grande parte à necessidade de a GM encontrar uma resposta inovadora ao Modelo T. A abordagem gerencial de Henry Ford, bem como suas preferências sobre a teoria da administração, são um paradigma do que havia de construtivo – e de imperfeito – nas abordagens iniciais da administração.

            Filho de um imigrante irlandês pobre, Henry Ford nasceu em 1863 e cresceu numa fazenda no estado de Michigan. Era fascinado por equipamentos mecânicos e tinha grande habilidade em consertar e melhorar quase qualquer máquina. Ele fundou a Ford Motor Company em 1903, e por volta de 1908 o primeiro Modelo T foi fabricado.

Quando surgiram, no início do século passado, os automóveis eram símbolo de status e fortuna, quase uma exclusividade dos ricos. Ford pretendeu modificar isso: o modelo T seria feito para as massas – um carro que virtualmente qualquer pessoa pudesse comprar. Ele entendia que a única forma de fabricar um carro assim era produzir em grande quantidade e o baixo custo. Ford concentrou seus esforços em sua fábrica na eficiência, mecanizando sempre que possível e dividindo as tarefas em seus menores componentes. Um trabalhador faria a mesma tarefa sempre e sempre, produzindo não uma peça inteira, mas apenas uma das operações necessárias à produção do todo; a peça incompleta seria então passada a outro trabalhador, que contribuiria com a operação seguinte. Ford conseguiu atingir uma eficiência notável. Embora o primeiro modelo T tenha levado mais de 12 horas e meia para ser produzido, apenas 12 anos mais tarde, em 1920, a Ford produzia um Modelo T por minuto. Em 1925, no auge da sua popularidade, um Modelo T saía das linhas de montagem da Ford a cada 5 segundos.

            Entretanto, a mecanização da fábrica teve alguns efeitos adversos. Quanto mais Ford pressionava seus empregados, mais descontentes eles ficavam. Em 1913 a rotatividade de mão-de-obra chegou a 380 por cento, e Ford teve de contratar dez vezes mais empregados do que precisava, só para manter a linha em movimento. Numa ação sem precedentes na época; Ford simplesmente decidiu dobrar os salários para conseguir as melhores pessoas e motivá-las a trabalhar ainda mais. Nos dias seguintes ao anúncio de que os salários estavam sendo dobrados, milhares e milhares de homens chegaram à fábrica da Ford procurando trabalho. A polícia precisou ser chamada para controlar a multidão.

            O estilo de administração de Ford era o lado negro de sua personalidade inovadora, e levou ao caos a hierarquia da gerência. Ford não aceitava bem as críticas, especialmente as feitas ao Modelo T. Quando seus melhores engenheiros sugeriam mudanças, eram ignorados e alguns até mesmo demitidos. Por causa disso, competidores como a Chevrolet, fizeram grandes progressos no mercado de automóveis. Além disso, Ford gostava de jogar um subordinado contra o outro, a ponto de nomear dois para o mesmo cargo para ver qual (o mais fraco, segundo Ford) iria recuar primeiro. Gerentes competentes abandonaram a empresa, que ficou excessivamente dependente do irascível Ford.

            Quando morreu, em 1945, Ford possuía mais de 600 milhões de dólares. Ele deixou uma marca indelével tanto na indústria quanto na sociedade americana. Seu nome é sinônimo de produção em massa e do desenvolvimento da moderna teoria da administração.

            Seguindo o conselho do especialista em eficiência Walter Flanders em 1908, Ford comprou terrenos em Highland Park, onde pretendia empregar as idéias mais modernas sobre produção, particularmente as de Frederick Winslow Taylor. Segundo profetizara Taylor, aquelas idéias trariam uma absoluta racionalidade ao processo industrial. A idéia era partir para cada função em unidades muito menores, de modo que cada uma pudesse ser mecanizada e acelerada e eventualmente passar a fluir numa linha de produção de pequenas peças que se tornassem cada vez maiores – a continuidade acima de tudo. O processo começou a mudar na primavera de 1913. A primeira peça da moderna linha de montagem foi o conjunto da bobina do magneto. No passado, um trabalhador – necessariamente um operário qualificado – fazia um magneto de volante do início ao fim. Um bom empregado poderia fazer 35 a 40 por dia. Agora, entretanto, havia uma linha de montagem para os magnetos, dividida em 29 operações diferentes realizadas por 29 homens diferentes. No velho sistema, demorava-se 20 minutos para fazer um magneto; agora, demorava-se 13.

            Ford e seus auxiliares logo se movimentaram para trazer a mesma racionalidade ao resto da fábrica. Rapidamente, impuseram um sistema comparável para os conjuntos de motores e transmissões. Então, no verão de 1913, partiram para a montagem final que, devido à aceleração do resto do processo, havia se tornado um gargalo apertado. Os trabalhadores agora moviam-se o mais rápido possível ao redor de um objeto estacionário de metal, o carro que estava sendo montado. Se os homens pudessem permanecer parados enquanto o carro inacabado passasse por eles, através da linha, menos tempo dos trabalhadores – ou seja, tempo de Ford – seria desperdiçado.

            Charles Sorensen, que havia se tornado um dos mais graduados homens de produção da Ford, iniciou a linha de montagem puxando lentamente por um guincho um chassis de Modelo T, através de 73 metros do solo da fábrica e cronometrando concomitantemente o processo. Atrás dele andavam seis trabalhadores, pegando peças de pilhas cuidadosamente espaçadas no chão e montando-as no chassis. Logo as soluções espetaculares vieram cada vez mais rápido. Instalando uma correia transportadora automática, Ford, em dado momento, conseguiu montar um carro em 93 minutos. Apenas alguns anos antes, na época da montagem com o chassis estacionário, o melhor tempo de montagem de um carro fora 728 homens-hora. Os executivos de topo da Ford celebraram sua vitória com um jantar em um hotel de Detroit. Adequadamente prenderam uma correia transportadora simples a um motor de cinco HP, usando uma correia de bicicleta, para servir o jantar ao redor da mesa. Isto caracteriza o espírito, a camaradagem e a confiança dos primeiros tempos.

            Dezenove anos, e mais de quinze milhões de carros mais tarde, quando Ford relutantemente chegou à conclusão de que teria de parar de fabricar o Modelo T, o balanço da empresa era de 673 milhões de dólares. E isso não era meramente um sucesso da empresa; era o início de uma revolução social. O próprio Ford acreditava ter alcançado um novo patamar para o homem comum. “A produção em massa,” ele escreveu mais tarde, “precede o consumo em massa e torna-o possível pela redução de custos, permitindo em decorrência maior comodidade no uso e preço mais conveniente.

            Não era de surpreender que o preço do Modelo T continuasse a cair, de 780 dólares no ano fiscal de 1910-11 a 690 no ano seguinte, e depois para 600, para 550 e, nas vésperas da primeira Guerra Mundial, para 360. A esse preço Ford vendeu 730.041 carros, superando qualquer outro produtor no mundo...

            Henry Ford, filho de imigrantes e ex-aprendiz de maquinista, tornara-se de fato um homem muito rico. Obviamente conseguira isso sendo um teórico inovador e bem-sucedido da administração industrial. Mas, tanto suas práticas como sua personalidade atraíram o fogo dos que criticavam sua atitude implícita com relação àquelas “massas” para quem ele originalmente aperfeiçoara o Modelo T, estabelecendo para o mesmo um preço acessível. Por exemplo: a duplicação dos salários dos empregados, que ele fez em 1914 e que foi amplamente divulgada, foi vista por alguns como uma manobra arrojada que abriu caminho para as relações entre administração e trabalhadores, e por outros como uma jogada para solidificar o poder paternalista de Ford sobre aqueles que dependiam dele para sobreviver. Além disso, muito depois de seus maiores competidores terem feito acordos com organizações sindicais, Ford resistia ferrenhamente à sindicalização de seus empregados. A repressão contra os “agitadores” sindicais por parte da polícia da empresa era comum dentro da companhia, até que, finalmente, tendo perdido uma eleição realizada no conselho Nacional de Relações Trabalhistas (uma entidade governamental estabelecida em 1935 para estabelecer o direito dos trabalhadores barganharem coletivamente), Ford assinou contrato com a United Auto Workers, em 1941.

            Pode-se observar algumas coisas interessantes neste artigo. A primeira é que os teóricos, quaisquer que sejam seus campos de atuação, tendem a ser pessoas e produtos de seu tempo. A segunda é que as teorias de administração, como as teorias em todos os campos, tendem a evoluir para refletir as realidades e as circunstâncias mutáveis do cotidiano. Do mesmo modo, os administradores devem ser sensíveis às mudanças nas circunstâncias e devem estar dispostos a mudar também. Caso não o façam, podem ser ultrapassados por competidores mais flexíveis.

            Essas duas idéias se aplicam a Henry Ford, o homem que abraçou corajosamente as idéias da administração científica, revolucionando nesse processo a indústria automotiva e a nossa sociedade.

            No entanto, muitas das práticas administrativas de Ford eram conservadoras ou não respondiam às mudanças dos tempos, e o seu domínio sobre o mercado automobilístico foi-lhe pouco a pouco arrancado por empresas com teorias e práticas administrativas mais avançadas. Sendo hostil à comunidade bancária, por exemplo, Ford recusou durante toda a sua vida investimentos externos em sua companhia, pegando capital emprestado apenas quando era absolutamente necessário, e preferindo financiar as atividades da corporação usando apenas os lucros da empresa. Também tendia a ignorar a dinâmica da indústria que, em ampla medida, havia fundado. Apesar de ter aberto fábricas da Ford para atender ao crescente mercado europeu, ele demorou muito a seguir ao conselho dos administradores de adaptar os equipamentos para fabricar tanto o freio hidráulico quanto o motor de seis ou oito cilindros; também resistiu a conselhos relativos a aperfeiçoamento na alavanca de mudança e na tecnologia de transmissão, e até mesmo deixou de introduzir cores variadas em sua linha de produtos (Ford preferia que seus carros fossem pretos). Seu desinteresse pela demanda dos consumidores por conforto e estilo terminou lhe custando a liderança da sua indústria, que passou para a General Motors, um conglomerado de mais de 20 empresas diferentes montado pelo fundador William Durant e por uma segunda geração de organizadores industriais americanos.

 

Adaptação compilada de – The Reckoning – extraído do livro Administração – Stoner e Freeman.